sexta-feira, 30 de maio de 2008

Menos

Li em frente a uma casa, antiga sede de uma clínica odontológica, em um bairro nobre da cidade:


"Mudamos para uma nova sede, própria, maior, mais moderna, mais confortável."


Com tanta pompa, senti que a mensagem não combinava com o meio: uma faixa de rua daquelas bem fudidas, pintadas à mão.


Faltou um pouquinho "mais" de verba e alguma noção a "mais".

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Preguiça

Preguiça do equipamento de última geração

Do melhor custo-benefício

Do que está no topo

Do Hotel 7 estrelas

Do decacampeão



Preguiça de ver o filme que acabou de entrar em cartaz

Preguiça de saber a última do dia

De ouvir o cd recém-lançado


Preguiça de frequentar o lugar da moda

Preguiça da moda

De certos modos

Preguiça de entender a gíria que ainda poucos repetem

De ler o livro que todos indicam

Preguiça de atualizar o blog

De descobrir um novo jeito de fazer

e de propagar o que foi feito

Preguiça de tanta gente propagando o que faz.


Preguica de mim

De você

De nós dois juntos

Pior ainda separados


Preguiça do que está no óbvio

E do subentendido


Preguiça do entendido e do que faz-de-bobo-pra-viver

Preguiça de quem finge que acredita

Do que é falado e do que está no subtexto

Do dito e do desdito.


Preguiça de quem faz para mostrar

Não para viver aquilo de fato

Enorme preguiça quando eu mesmo faço isso.


Preguiça do shampoo que não dá certo

Do fio-dental que sempre fica preso no mesmo dente

Do remédio que não cura.


Preguiça do livro que não desenvolve

Da idéia que não desempaca

Daquela minha idéia que ficou ótima

Mas que foi desenvolvida por outra pessoa que eu nem conheço.


Preguiça de dizer: "viu como eu disse que ficava bom?"

Preguiça de dizer qualquer coisa

Preguiça de escrever mais



E dessa minha gripe que insiste em não ir embora.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Folha On-line, 20/05/08

"Sem Marina, licença pode sair mais rápido, diz Lobão."


Certas notícias confundem completamente minhas referências. Pode conferir que é verdade.

http://www1.folha.uol.com.br/folha/dinheiro/ult91u403591.shtml

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Fase Pré-Disarmedzóica

No meio de um momento Disarmed-crise, fiquei na dúvida sobre o que escrever. Alguns assuntos me vieram à cabeça, busquei inspirações que gostei e que acabei aprendendo um pouquinho com elas. Mas achei que a idéia de postar um texto que publiquei há mais tempo era boa. Este de 2005, em especial, estava fresco em minha memória.




Pessoas-ventilador


Você já ouviu falar nas pessoas-ventilador?

São aquelas pessoas que ficam nas festas, bares e boites olhando

De um lado para o outro

De um lado para outro

De um lado para o outro

Elas não entendem as conversas

Nem prestam atenção

Ficam ventilando

Elas fingem que estão escutando o que você fala

Mas se você faz uma pergunta

Elas respondem com um "HÃ?" de todo o tamanho

De repente parece que o ventilador estraga e elas olham fixamente para um alvo só

Irradiando aquele tufão de vento

Para ver se o alvo sente um friozinho na espinha

Se não sentir, não tem importância: o ventilador continua a rodar

Até a noite acabar.


Festas com pessoas-ventilador têm uma vantagem: ninguém sente calor.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Desliguem os equipamentos eletrônicos

Tem um lugar que eu fui algumas vezes e até andava sumido.

Resolvi voltar ontem, estava precisando de dar um tempo do mundo.

O meu estava muito cheio.

Trata-se de um espaço de meditação.

A cena que mais me faz lembrar de lá e até com bastante simpatia foi uma vez que troquei de roupa, pus algo como uma bermuda de moleton e um agasalho (era inverno). Fiquei descalço ou só com meias. Completamente anti-fashion.

Lá as pessoas chegam e ficam numa espécie de sala de espera tomando um chazinho, conversando baixo, já entrando no clima.

Quando a dona do lugar chegou, ela nos pediu que entrássemos na sala de meditação, mas que deixássemos tudo nosso ali mesmo na recepção, sem medo de roubo e tal. Enfim, sem medos.

Olhei para o que tinha deixado para trás:

Um par de tênis da marca A

Um relógio da marca B

I-Pod da marca maçã mordida

Chave com chaveiro de museu bacaninnha

Celular para não perder o contato um segundo sequer

Carteira dimarca

Calça damoda

Meias fedidinhas tentando sobreviver com algum estilo

Pasta cheia de papéis inúteis insistindo em não ir para o lixo

Outras máscaras que não estou com preguiça de discrever agora.


Ela disse nos chamando novamente:

"Venham, deixa isso aí, quero só vocês."

Entrei com a sensação de que, sem aqueles apetrechos, eu não era nada.

Mas logo raciocinei que, deixando tudo aquilo para trás, tinha nas mãos a grande chave para descobrir quem eu realmente era.

terça-feira, 6 de maio de 2008

De Disarmed para disáineres

Em um certo momento da história, o gato do rabino, que adquiriu fala, diz:

"Vamos à casa do seu rabino para perguntar se um gato que fala pode fazer o bar-nitz-vah.

O rabino diz que não, que o bar-nitz-vah não foi feito para os gatos.

Pergunto-lhe qual a diferença entre um humano e um gato.

Ele me responde que Deus fez o homem à sua imagem.

Peço-lhe que me mostre uma imagem de Deus.

Ele me diz que Deus é uma palavra."


Extraído do livro "O Gato do Rabino"de Joan Sfar diretamente para os meu amigos designers, diretores de arte e imagéticos em geral (estes que não consigo parar de encher o saco. E nem ficar muito longe, já que sem eles não sobrevivo.)

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Conto real

Estava aqui pensando em escrever algo para o aniversário da minha irmã mais velha. Isso, com a morte do meu irmão, ela passou a cumprir este papel para mim, para toda a minha família, talvez. É a certa da casa. Casou-se nova, com moço de família, futuro promissor. Ele fala que chegou à família antes de mim, lembra-se do meu nascimento, importante para não abalar minha posição de caçula. Fato que eu adorava sair da minha rocinha-natal e ir passar uns dias de férias na capital, no ap da minha mana mais velha. E ali estava um mundo muito diferente para o menino da fazenda. Não podia isso, não podia aquilo. Med, chupa esta laranja, mas não pode arremessá-la em direção ao horizonte depois de desfrutá-la. Como assim? Vamos passear, tem que colocar tênis. Ai, que sofrido este mundo de regras, pensava eu com a minha filosofia de 8 anos. Bom, a bucha da laranja foi parar na vidraça da janela, o tênis eu não tinha lá: as opções eram descalço, havaianas ou sapato, que eu só tinha porque tive que ir a um casamento: o dela. Foi aí que Fafá, minha sobrinha,ganhou um presente, um bichinho, um passarinho japa, todo eletrônico e...muito diferente dos passarinhos que conhecia e amava vê-los voar livremente. A novidade virou uma bomba na minha mão. Uma bomba que fiz quebrar o bico e nem sabia o que fazer com aquilo. Não tive coragem de me entregar, então escondi o bichinho. E a busca em casa, comandada pela minha poderosa irmã, se iniciou, como se fosse de um corpo de uma pessoa desaparecida. Lembro-me que fugi em determinado momento. Andei em linha reta por uma rua, de modo que conseguiria voltar através de um fio de lã imaginário, adquirido da lenda do Minotauro. Cheguei a uma avenida larga e fiz questão de decorar seu nome lendo em um placa: CONTORNO. Sabia que esta seria parte importante da minha vida. Bom, ali estava o contorno da brincadeira, o limite da rebeldia, da insubordinação, da minha eterna luta contra as regras. Voltei em linha reta, decidido a me entregar. Entrei em casa (a dela também é minha, com outras leis) e me postei em frente à autoridade da minha irmã mais velha, olhei para cima, nos seus olhos e disse: Rose, aqui está o passarinho. Eu o estraguei e não tive coragem de falar. Aí chorei enquanto ela entregava o bicho desbicado para a filha que brincava com ele, alegremente, mesmo com os seus defeitos. E mesmo com defeitos, acho que eles aprenderam a me aceitar. Acho que estamos aprendendo a nos aceitar assim. E estamos muito mais felizes.

Rose, parabéns pelo níver e pelas nossas revoluções internas.